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24 de outubro de 2025
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‘Chegaram muito perto de mim e da minha família’, diz promotor Lincoln Gakiya sobre novo plano do PCC para assassiná-lo

O promotor de Justiça Lincoln Gakiya, há mais de duas décadas na linha de frente do combate ao Primeiro Comando da Capital (PCC), voltou a ser alvo de um plano de execução elaborado pela facção criminosa. Em entrevista concedida nesta sexta-feira (24), Gakiya falou com franqueza sobre o novo atentado frustrado, os riscos permanentes que enfrenta e as falhas do Estado em garantir segurança a autoridades sob ameaça.

A operação, deflagrada nas primeiras horas do dia pelo Ministério Público de São Paulo, em conjunto com a Polícia Civil, Militar e Penal, cumpriu 25 mandados de busca e apreensão em cidades da região oeste do Estado. A investigação revelou um plano do PCC para assassinar o promotor e o coordenador de presídios Roberto Medina.

‘Chegaram muito perto de mim e da minha família’

Ao falar sobre as descobertas da investigação, Gakiya descreveu o impacto emocional de saber que criminosos chegaram a monitorar sua rotina e a de seus familiares.

“Eu já estou há 20 anos trabalhando em investigações contra o PCC e ando com escolta há mais de dez. Já houve vários planos para me matar que conseguimos detectar, mas, mesmo assim, não deixo de sentir medo. Desta vez, eles chegaram muito próximos — havia filmagens por drone da minha casa, da minha rotina, da minha família. É algo aterrorizador.”

O promotor explicou que as imagens foram encontradas em celulares apreendidos durante uma investigação de tráfico de drogas em Presidente Prudente. O material mostrava levantamentos detalhados de rotas, locais frequentados e horários, que seriam encaminhados à chamada “sintonia restrita” — o setor do PCC responsável por atentados e resgates.

“Eles chamam de ‘salve’ a ordem para executar. A sintonia restrita funciona como um departamento de homicídios dentro da facção. São criminosos experientes, especializados em ataques e resgates, que não se envolvem em outras atividades. O plano para me matar e para matar o Dr. Medina estava nessa fase: o levantamento de rotina, que é o passo anterior à execução.”

‘O Estado ainda age de forma reativa’

Gakiya reconheceu que o Brasil ainda não possui estrutura adequada para antecipar e neutralizar atentados desse tipo.

“Infelizmente, o Estado ainda age de forma reativa. Foi numa investigação de tráfico que encontramos, por acaso, esse plano. Conseguimos impedir um atentado porque tivemos sorte e porque o trabalho das polícias foi eficiente, mas não porque exista um sistema estatal preparado para isso.”

Ele lembrou que o próprio Ministério Público paulista compartilhou, em 2023, informações que ajudaram a Polícia Federal a identificar outro plano do PCC, que incluía o senador Sérgio Moro como um dos alvos.

“Naquele caso, eu também era uma das vítimas. Foi uma ação coordenada entre o PCC de São Paulo e outras unidades da facção. O problema é que, mesmo depois de anos de investigações, o país ainda não tem mecanismos permanentes de proteção a promotores, juízes, delegados e diretores de presídio.”

‘Não há garantia de proteção, nem depois da aposentadoria’

Um dos pontos mais contundentes da entrevista foi a crítica do promotor à falta de legislação que assegure proteção contínua às autoridades ameaçadas, inclusive após a aposentadoria.

“Eu já estou há 34 anos no Ministério Público. Não há nenhuma garantia de que, ao me aposentar, terei o mesmo nível de escolta. Temos apenas uma resolução do Conselho Nacional do Ministério Público, mas não uma lei que assegure isso. Quando os governos mudam, as proteções também mudam. O caso do delegado Rui Ferraz Montes é prova disso: ele estava aposentado, sem escolta, e acabou assassinado. Eu temo que o mesmo possa acontecer comigo ou com outros colegas.”

‘O crime se organiza mais rápido do que o Estado’

Gakiya destacou que o crime organizado avança com sofisticação, enquanto o aparato estatal ainda é lento para se adaptar.

“O PCC criou um setor exclusivamente voltado a matar autoridades. Eles têm divisão interna, hierarquia, disciplina e estrutura. O Estado, por outro lado, demora a reagir. Enquanto o crime se profissionaliza, nós ainda dependemos da sorte e do empenho individual de policiais e promotores para impedir tragédias.”

‘A investigação salvou vidas’

O promotor afirmou que a operação desta sexta-feira — batizada de Operação RECON — foi essencial para evitar novas mortes e reafirmou a importância da integração entre as forças de segurança.

“Foram cerca de 180 policiais envolvidos. A investigação acabou salvando a vida do Dr. Roberto Medina, que até o mês passado não tinha escolta. Essas ações mostram a força do trabalho conjunto entre o Ministério Público, a Polícia Civil, a Militar e a Penal. Essa união faz a diferença entre a vida e a morte.”

‘Eu sigo com medo, mas sigo trabalhando’

Mesmo sob ameaça, Gakiya reafirmou que não pretende recuar de sua missão.

“Eu sigo com medo, é claro. O medo é natural, é humano. Mas sigo trabalhando, porque se recuarmos, o crime vence. O que precisamos é de mais estrutura, mais inteligência e, principalmente, mais proteção para quem está na linha de frente.”

Com a operação de hoje, o Ministério Público e as polícias de São Paulo frustraram mais uma tentativa de ataque contra autoridades do Estado. Para Gakiya, porém, a luta está longe de terminar:

“O crime não vai parar. Mas nós também não vamos. Cada plano frustrado é uma vida preservada — e uma mensagem de que o Estado, apesar das falhas, ainda reage.”

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